sábado, 29 de janeiro de 2011

Ponteiro da vida

     Olhando para o teto, parei para pensar na vida em suas mínimas frações de tempo, e Concluí. Me impressiono em como um voltar da esquina, um piscar de olhares, um chegar mais tarde, uma declaração – não necessariamente amorosa, uma frase lida, uma não lida, uma palavra, uma interjeição, um indicador a puxar o gatilho, um toque, um tapa, um sussurro, um grunhido, um enrugar a testa, uma lágrima caída, uma lágrima enxugada,  um assentir com a cabeça, um pode ser ou mesmo um tanto faz... são capazes de transformar-nos completamente e guiar nosso destino para outros rumos. Mutáveis caminhos. Concluí. A vida muda mesmo entre o “tic” e o “tac”.

sábado, 22 de janeiro de 2011

Salgado

     Senti quando a onda bateu estridente sobre meu corpo. Levou. Foi arrastando-o violento e eu deixei-me seduzir por seu temperamento. Por um instante, não sentira mais o banco de areia sob meu organismo, a onda chegara e estava me levando... para onde? Não me interessei, deixei levar. De longe vi o sol a dançar no reflexo da água, mesmo com a visão turva fui capaz de enxergá-lo. E flutuando fui sentindo a correnteza a atritar sobre minha epiderme, percebendo que não estava mais na posição anterior, que suavemente capotava oscilando cima a baixo, uma gostosa sensação, apesar da falta de oxigênio já causar um certo incômodo. E controlado como marionete, foi-se o corpo submerso, sem receio do provável encontro com rochas grandes ou pedras capazes de, numa simples pancada, causar sérios danos. Mas o prazer vinha de fora pra dentro, estava bom enquanto arremessado ainda mais. Mas como toda onda, ao chegar no alcançado destino, o regresso veio em seguida. O corpo encontrou novamente a macia areia, e a onda o lá deixou. Mas não simplesmente isso, levou uma parte dele, uma importante fração de seu íntimo foi levada pela correnteza, sem qualquer manifestação do organismo ali estirado. Por dentro senti a perda, mas não fui capaz de reagir. E o que restou sobre  sedimentos mornos foi um incompleto ser, ofegante, úmido, doído... e ainda assim, capaz de esperar  uma nova onda o removê-lo.

terça-feira, 18 de janeiro de 2011

Não me deixa dormir

     Dizem que primeiro amor a gente nunca esquece. O fato é que quase nunca o nosso primeiro amor continua a viver com a gente e está disposto(a) a passar o resto da vida do seu lado. Bom, esse não é bem o meu caso. Ela realmente vive comigo ainda e estamos dispostos sim a morrermos juntos, mas não como amantes. Nosso amor é diferente, é aquele que é peça chave na vida de qualquer um, é um amor que sem ele, ou sem senti-lo por perto, somos apenas metade, somos desamparados e nunca os mesmos. Nosso amor é o mais importante vínculo afetivo à não familiares: A amizade.
     Nesses anos, ela foi pra mim como aquele insistente inseto que tanto pertuba nossas noites, justo as noites em que queremos dormir. O inseto marca presença a todo momento e você está sentindo ele toda hora em seu ouvido, fazendo barulho. Mas você não dá tanta importância a ele, você quer dormir. Mas ele está no mesmo metro quadrado que você há um bom tempo. A presença do mosquito, apesar de insistente, torna-se inevitável. Mas você não move uma pálpebra para se dar ao trabalho de ao menos ver o que fazer com ele, ter o cuidado de levá-lo até a janela, ou mesmo dar fim àquele persistente ser vivo. De barriga para cima, de bruços, de um lado para o outro você se locomove, mas o inseto não descansa de bater suas asas! Finalmente você abre os olhos e resolve ligar a luz. Com a visão embaçada, olhos recém abertos incomodados com a luz, você se depara com o artrópode, apertando bem os olhos para enchergar melhor. "Meu Deus" sussurros que saem de sua boca ao admirar a beleza da magnífica libélula que escolheu seu quarto para passear. E você chega mais perto, quer apreciar os mínimos detalhes, quer conhecer melhor o animal,  de beleza tão esbelta que você sente vontade de admirá-lo pro resto da noite (ou da sua vida!). Daí já esquecemos completamente a possibilidade de descartá-lo, pelo contrário, quanto mais tempo para admirar a preciosidade melhor. E é assim que me obrigo a conviver com minha libélula, de alva alma e coração inocente, pessoa que tanto me arranca suspiros de admirações, o inseto-gente que desde que descobri sua beleza, fecho as janelas da minha casa e nunca mais eu abro mão.

Jéssica Freitas, amiga minha, do Jardim de infância ao Jardim da vida, ♥

terça-feira, 11 de janeiro de 2011

Temp(erament)o


Tempo que me cura,
Tempo que me fere,
Tempo quem o procura,
Com o tempo logo esquece.

Tempo que se aproxima,
Tempo que me ama,
Tempo que me odeia,
Tempo que me afama.

Tempo que me transfoma,
O tempo é um professor!
O tempo, ensina que o tempo,
É um verdadeiro sucessor.

Tempo que me mata,
Tempo que em mim nasce,
Tempo que em mim aflora,
Tempo que sorri, e que chora,
Tempo se falasse...

Tempo que aquece,
Tempo que esfria,
Tempo que ora traz noite,
Ora amanhece um novo dia.

Tempo que contempla,
Tempo transformador!
Tempo que o tempo dará,
Tempo que o tempo marcou.

quarta-feira, 5 de janeiro de 2011

Adoração em vocábulos

Sacramento esse diálogo,
Aprecio ao nos ver escrevendo.
Diz-me, "inebriante tu és",
Que te digo, mais que importante, estás sendo.

domingo, 2 de janeiro de 2011

Presente egípcio

     Uma mente precoce, a loira que está longe da ignorância. Uma ressalva ao pigmento dos seus fios, que ora oscilam à um ruivo/rosa de suas artes inovadoras e intrigantes, de fato. Uma alva pele, límpida, capaz de transparecer sua própria alma, tão delicada e reluzente quanto sua melanina. Um róseo formidável reveste sua desenhada e macia boca – sim, conheço sua maciez, ao provar do seu doce sabor ao pressioná-la em meus lábios. Tão delicados os lábios pertencentes à ela quanto um algodão recém removido da colheita, quanto um ser vivo que acaba de nascer, quanto seu próprio jeito de corar ao sentir-se envergonhada – jeito tal que, ao vê-lo, me apaixono mais e mais. E é mais que inevitável deixar de lembrar, e de tentar descrever o complexo e embaraçoso olhar que carrega essa alma inocente. Oblíquo e dissimulado, insisto em imitar Bentinho na descrição dos olhares de Capitu. Já os olhos desta Capitu não carregam tantos mistérios, pelo contrário, são determinados (até demais, às vezes). São olhos que dizem, que sentem, que ouvem, que estapeiam também. São tão vivos que parecem outro organismo, dentro desse conjunto de perfeições. Tão bem feitos, e um tanto ardentes que consigo enxergá-los nesse instante, nessa breve descrição. Atriz que é, ou brinca ser, consegue muito bem ocultar sentimentos, acostumada a não compartilhá-los e reservá-los junto com seus receios numa torre de mármore. Porém, essa tarefa torna-se cada vez mais difícil para si mesma, cada dia que passa consigo decifrar seus códigos, seus segredos, suas aspirações, e com eles vou me perdendo por entre as escadas da torre, e vou admirando mais a menina, minha menina que encontrou no jardim de sua casa a fórmula do amadurecimento, e que até então guarda-a consigo. E quanto a mim, resta apenas aparar a baba que escorre do meu rosto nos meus momentos de orgulho por ter encontrado um alguém tão especial quanto ela é. A sabedoria e a ingenuidade dialogam em seu interior, e por incrível que pareça estão sempre de mãos dadas. Francamente, nunca pensei em encontrar um dia uma pessoa dessa natureza, e agora tenho esse ser idealizado para chamar de amor.  Minha dádiva de Isis, quis a vida me presentear de forma tão boa? Venero pois essa obra egípcia, a qual meu coração fisgou e agora está difícil viver sem. Reconheço que já comentei de sua sapiência, mas não me canso de ressalvar o quanto admiro sua forma de pensar e de ser. Só espero que esse árduo e fádigo (de tanto carregar um forte sentimento) amor seja reconhecido por aquela da qual escrevo, e carregar a certeza de que mesmo que não seja eterno, se eternize enquanto dure.