sábado, 28 de maio de 2011

Presente ausência

   Em tédio por mais uma vez cultuar a rotina, debruçado na carteira e a espera de mais fadigosas aulas, sou tomado pela sua voz a me chamar, timbre suave, brisando doce em meus ouvidos. Apesar de reconhecer a improbabilidade de sua próxima presença, arrisquei fitar meus arredores. Ninguém. Sinto levemente seu perfume a exalar – como não esquecê-lo? – dançando como em ultima performance sobre a atmosfera da sala e atingindo meus pulmões em cheio. Creio estar delirando, mas sensata é a certeza de quem pertence tal odor e voz. Fechei os olhos e sua imagem foi projetada minuciosamente, quase que proposital. Seus fios dourados harmoniosos com o vento, fazendo par com seus olhares de mar em turbulência, por onde afogo-me sem datar meu regresso; o teu semblante, áureo, transfigurando-se em um patamar angelical –anjo meu- e seu sorriso que convida meus lábios a sentir o seu sabor. Perdi a direção de meus olhares ante tanta beleza como perco-me na tentativa de passar para o papel o que a mente (ou o coração, talvez) foi capaz de enxergar. Abri os olhos e fui dominado pelo  tamanho desejo de rever-te novamente, contudo não em esquinas da minha memória, mas sendo capaz de cercar teu corpo com meus braços. Diante de tão rápidas seqüências de sensações, inebriado por sua visita (mesmo que meramente psicológica), me dou conta de que não pode ser apenas atração. Está além do meu alcance, deixei sem perceber que a maré dos teus olhos me levassem a dimensões inabitáveis e o que mais me assusta a respeito é que acabo achando tudo isso bom. Muito bom.

quarta-feira, 4 de maio de 2011

Transfiguração

Espremo o que há em meu peito até o bagaço,
Deixo escorrer toda poupa secretada entre pulmões,
Retiro cautelosamente toda dor, como cirurgia,
Raspo as pregas enraizadas, custosas a sair, em agonia
E sinto fluir tórax abaixo o rubro suco,
Serpenteando pelo corpo, espalhando-se no solo.
Quando atentei a poça que no chão havia,
O que deixei derramar,
Palavras.